Não se disputa por amor, nome disso é posse

Eu
queria te dizer que foi de uma hora para outra, sabe? Acordei, não senti mais
nada e segui em frente. Queria te dizer que a saudade nem sequer bateu a minha
porta, que tive longas e profundas noites de sono e sonhos em que ele não
estava presente. Porque, de fato, não era presente. Era passado. Mas eu também
era. Eu vivia no passado, relembrando fases, me martirizando por decisões,
colhendo vagarosamente as consequências.
A
gente quer fingir que está tudo bem, que todo aquele tempo dedicado a uma
relação possa ser resumido em minutos, ainda que tenham sido anos. A gente quer
tanto ficar bem que arrasta toda mágoa que encontra pelo caminho e engole em
seco; não adianta mais espernear. Acontece que a mudança que eu tive ao lado
dele foi um processo. Não posso agir como se ainda fosse a mesma pessoa, como
se cada superação não tivesse me feito mais forte e cada contradição tivesse me
dado a oportunidade de me conhecer melhor. Eu já havia mudado, essa era a
verdade que ninguém me dizia. E o mais assustador disso tudo é que esse
processo é infindável; ainda me surpreendo ao descobrir que alguns dos meus
gostos já não são mais tão meus.
Meu
sorriso mudou, meu coração também. Sinto uma preguiça enorme de me envolver
novamente. Foi por tanta pressa em ter alguém que esqueci como ser alguém que
eu goste. Não faria de novo, e não porque não tenha valido a pena, muito pelo
contrário, valeu tanto a pena passar por isso que não posso ignorar tudo que eu
aprendi. Eu não faria de novo porque trago lições cravadas no peito e
sentimentos, que eu não sabia que existiam dentro de mim, à flor da pele.
Sinto-me plena por ter sobrevivido ao fim de duas metades pra renascer inteira.
Às
vezes, me pego pensando em quantas pessoas passam pelo o mesmo que eu todos os
dias. Tanto amor guardado se desfragmentando em corações tão pequenos incapazes
de reconhecer seu valor. Tanto carinho dedicado as milhares de possibilidades
de se tornarem demonstrações públicas calado diante do orgulho. Tantas juras de
perdão quebrando a cara de quem confiou. Tanta gente que passa pela gente e nos
deixa sem chão. Tanta gente que fica ao nosso lado enquanto tentamos nos
distanciar.
Não
estamos todos no mesmo barco, hoje compreendo isto melhor. Tem gente que faz
questão de ficar triste, se apega ao lado negativo, não deixa as lágrimas
secarem em seu devido tempo. E tem gente que decide ser feliz porque escolheu a
si mesmo pra isso. Pena de quem não valorizou. Eu já joguei no outro time,
senti pena de mim porque me achava no direito de enaltecer a falta que ele me
fazia. Mas aprendi que chorar não torna a ausência mais poética. Sofrer não
torna real uma relação que, muitas vezes, se passou dentro da sua cabeça. Bons
momentos não compensam dias inteiros de martírio ao se agarrar a essas
lembranças. Aprendi com meus próprios erros que insistência não faz alguém
ficar, não se suplica amor a ninguém. Aprendi que só querer muito alguém não
basta, é preciso que ele lhe queira, no mínimo, na mesma medida. Aprendi que,
às vezes, você tem que parar de remar contra a maré e se deixar levar
naturalmente. Isso não é desistir, é como levantar uma bandeira branca e pedir
uma trégua ao universo. Isso é deixar que cada um colha as consequências do que
plantou. Isso é confiar na sua própria consciência, saber que fez tudo que pôde
e livrar-se do peso de carregar a culpa por falhas que não eram sua
responsabilidade consertar. Aprendi isso também.
Eu
que já desafiei armada em argumentos com sentimentos afiados tanta gente a me
amar, descobri aos poucos que me perdia ainda mais em cada luta. Não há
vencedores em um jogo de ego. Não se disputa por amor, o nome disso é posse. Ou
obsessão. É com enorme prazer que hoje as portas da minha vida estão abertas,
ninguém é obrigado a ficar. Eu poderia ficar triste por todas as pessoas que
partiram sem pedir licença. Talvez eu devesse ficar. Mas não tenho porque
lamentar uma perda que não foi minha. Quando encontramos a nossa paz interior
nunca mais nos sentimos sozinhos.
P.s: Texto lindo tirado do blog Bendita Cuca
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